21 de dezembro de 2014

Emanuel Medeiros Vieira


“Civilizações feneceram e isso me consterna. Incas, Maias, Assírios, Fenícios, 
Babilônios, Gregos. Não os conheci. Não os conheço (…)
Que insuspeitas relações tiveram? (…) A arte são marcas de passagens.
(…) Não sei porque  escrevo, menos ainda o que isso possa significar.” (…)
(Herculano Farias)
“Nada sabemos, a não ser que há uma noite/pura e vazia à nossa espera. 
Uma noite intocável/além do fogo e do gelo, e de qualquer esperança.”
(Ledo Ivo)
E continuamos a cada dia. Tentando celebrar os momentos –  encantamentos
Sim: há soberba, cobiça, pessoas que se acham insubstituíveis, celebridades vãs. 
E depressa desaparecerão.  Mas continuamos.
Há fé (às vezes). Há sombras, pó, e esperança.
“Estás sendo pessimista”, adverte uma voz interior. Basta olhar o mundo ao redor. 
Nada de novo. É preciso manter o circo. Sempre. O cantor famoso “passou”, 
espremido como laranja. Criam-se outros. Como a loira gostosa no anúncio 
de cerveja. A insinuação subliminar dos espertos publicitários: 
“tome essa cerveja e terás a loira”.
E há os marqueteiros. Ganhando rios de dinheiro, estabeleceram o reino 
da mentira virtual. “Mas as ditaduras acabaram na América a Latina”, alguém lembra. 
E o que veio depois? Desagregação (traição, deslumbramento) de muitos sonhos 
e dos maiores valores. E as revoluções implantadas viraram sistemas totalitários. Não?
E criamos todos os dias. Será a arte que nos salvará? “Inventamos” uma realidade. 
Não a revelamos. E continuamos. Parece que já existem mais escritores que leitores. 
Toneladas de opiniões (nos jornais, no mundo virtual) não saciam. 
Pois a incompletude é a nossa sagrada e irreversível marca. Como em
 tantos momentos, talvez saibamos mais o que não queremos do que aquilo que queremos.
A cura é a morte do desejo? Civilizações morreram.
Ando por Pompéia, está frio, e penso em todos que por aqui andaram, 
em todos os pés que aqui pisaram.
Penso o mesmo no Pelourinho – “ouvindo” o gemido dos escravos. 
Mas a agitação dos turistas com suas máquinas fotográficas e celulares, 
é mais forte do que as minhas reflexões. E meninos cheiram crack e assaltam.
O desejo é registrar tudo. Tudo. Mas somos meros fragmentos de outros fragmentos.
Há mais motivos para beber do que para não beber – eu sei.
Mas – ainda mais moralista na maturidade – creio que é melhor não beber. 
Sim: pela vida (perdoem o lugar-comum.). Mas tal opção é absolutamente subjetiva, 
e prefiro ouvir um Canto Gregoriano nesta capelinha do que os berros e gritos em um culto, 
garantindo que Cristo voltará (e se deres mais dinheiro, ele chegará mais rápido).
É outra manhã. Sim, sonhávamos refundar o mundo, e a alegria não-napoleônica de uma
criança mexendo numa máquina de escrever – estranhando –, e um pássaro cantando é
maior que isso. Mas, é claro, também passaremos e bem mais rápido que as civilizações. 
Mas – mal rompendo a aurora – estarás aqui de novo, seguindo o ofício, não buscando álibis. 
E continuarás, até o dia em que escutarás um assobio e irás – sereno – atravessar a ponte.
(Brasília, janeiro de 2014)

Nenhum comentário: